Thursday, March 16, 2006


A sedução.

A sedução é apenas um convite. Um convite ao abandono mútuo. É o abandonarmo-nos na esperança que mais tarde iremos recuperar esse bocadinho de nós que se foi. Obviamente no outro. É uma espécie de troca directa, entre mercadorias perdidas.
Seduzir é dizer ao outro que temos algo que a ela lhe falta. É estar pronto a dar esse pouco. É, ao mesmo tempo, uma troca; é pedir ao outro aquilo que nos falta. Às vezes, só o corpo. É por isso, que vemos casais por uma única noite. Foi apenas uma transação comercial, não de numerário, mas de carências afectivas. Ele deu, ela aceitou. E vice-versa.
Seduzir é também um jogo. Um jogo de experimentação. É um experimentar de poder - quem tem mais para dar? quem tem mais necessidade de perceber? É um jogo de poder onde um tenta dominar o outro, conquista-lo.
Seduzir é recarregar as baterias do ego. Uma necessidade do egoísta.
Não se cai em contradição quando se diz que, seduzir é um abandono de si mesmo, e ao mesmo tempo, uma necessidade do egoísta. Seduzir, é uma necessidade do egoísta cuja única linguagem que ele entende é obrigatoriamente a do abandono de si mesmo.O egoísta só pode satisfazer a sua necessidade de afecto, se experimentar esse abandono de si mesmo. Apenas porque ele entra em confronto, seduz, outro egoísta. E assim, ambos têm de abandonar-se. Seduzir-se mutuamente.
Tinha uma ave. Uma ave capaz de atravessar os céus.Apenas uma metáfora. A metáfora milenar da liberdade.
Amar plenamente é a prova imaginável e única do altruísmo. Um altruísmo enganoso, obviamente. É o abandonarmo-nos totalmente a outro por uma necessidade interior. Que é a absorção do outro. E, para isso, só nos é possível utilizar uma única linguagem: a do abandono de nós mesmos. A mesma troca de mercadoria, a mesma exaltação do jogo do poder. Dar o que se tem, para receber o que se quer. Esta a lógica mais equalitária. A do egoísta, dar-se o mínimo para receber o máximo.
O egoísmo não é um defeito. O egoísmo também não é uma virtude.
Ser egoísta é como ter dois braços, duas pernas, uma cabeça, olhos, nariz, e boca. É hereditário. Nem é um defeito de fabrico. Talvez seja primitivo para a nossa sociedade civilizada. É inato, como o nosso instinto de sobrevivência.Nem sequer nos é permitido fugir ao egoísmo. Qualquer opção que se faça, mesmo que isso beneficie alguém que não nós mesmos, é uma opção do eu. Uma opção do ego. Optar, escolher, decidir, são acções que remetem ao ego, ao egoísmo.
Amar plenamente é a única prova do altruísmo. Do egoísmo mascarado.
O arrependimento é mais uma prova do egoísmo.
É indiferente se nos arrependemos de ter feito o bem, ou de termos feito o mal. O arrependimento é um olhar para dentro, para o ego. Quando nos arrependemos de ter feito mal a alguém, não nos preocupámos com o sofrimento do outro, ou se nos preocupamos, só o fazemos porque também sofremos com esse sofrimento alheio. Pesa-nos a ideia de sermos nós os desencadeadores desse sofrimento. Arrependermo-nos, é tentarmos expulsar do ego esse constrangimento. É o único modo de mascarar um erro, e fá-lo pelo processo de experimentação que é o da aprendizagem. O aprender da perda.
O egoísmo foi perjurado.O egoísmo é a prova da adaptação do homem à cultura da civilização ocidental.O egoísmo é a forma do homem se transformar em ave. De atravessar os céus. É a sua metáfora da liberdade.
O egoísmo é a solidificação da individualidade. É isso que impede o homem de se diluir na multidão. É a sua garantia de ser único e insubstituível. E isso torna-o um ser potencialmente amado.As pessoas de grande personalidade, de grande carisma, são por um lado as mais egoístas, e por outro lado, as que melhor praticam o egoísmo mascarado

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