Sunday, April 13, 2008

O GRITO QUE CALO

O coração dói, a alma chora, o rosto se contrai, o sorriso desaparece. Um nó sufocante invade o peito, não sei se a vontade maior é gritar ou calar. Os olhos ardem, a pele arrefece, os lábios secam, as forças desaparecem, o corpo esmorece, a boca engole palavras que não podem ser ditas. O cérebro não coordena os pensamentos, a mente fenece. O grito se cala, o corpo se embala, a cabeça anda á roda, O reflexo desaparece,
A lágrima cai. O peito molha-se, a dor aumenta, o grito sufoca, a saliva seca e…
Outra lágrima cai.... A cabeça aperta, o corpo contrai-se, os olhos quase fecham e a visão se esvai. O escuro é mais seguro, ninguém precisa ver, Mais uma lágrima que cai... Pensamentos misturados, o coração mais apertado, solta o grito sufocado, sem palavras, só molhado,
Formando lágrimas que caem. Lágrimas que ora despencam sobre a face. Tempestade temporal, tentando aliviar a dor, de uma alma tão sofrida,
Que parece perder a vida, quando sente a despedida. Meu Deus.. que desespero… meu Deus que dor…

Friday, July 27, 2007

Sozinho na noite

Sozinho na noite.
Continuo a percorrer solitários caminhos.

Na contingência intransigente de ser eu.
Apologia do eu.
Estranha dialéctica esta.
Batem horas, não pulsam corações.

Aguardo o contacto da tua voz.
A memória atraiçoa-me.
A perfeição auto defende-se.
Rostos, aromas, sensações, nada se guarda.

Exigências de uma contemporaneidade vivida.
Estamos juntos, estamos distantes.

O Corpo Amado

Como pode alguém sonhar á distância com o corpo amado? Como pode alguém escrever sobre ele? Fazer da pele folhas de papel? Transformar as marcas mais secretas, a geografia dos poros, a arqueologia das cicatrizes em palavras, frases, textos?
Como embalsamar as pernas em letras? Não, isto não é possível. Muitas coisas ficariam esquecidas. As palavras como coxas, mão, rabo, ombro, lábio, queixo, pêlo, umbigo, pescoço, joelho e outras tantas, é preciso esquecê-las para não turvar este corpo.
Como pretender que os pequenos abismos das consoantes possam acolher as superfícies desta paisagem, com seus tremores e nervosismo? Como nomear, descrever, narrar este corpo que entre a penumbra se esconde e se anuncia? Sequer ouso tocá-lo. Olhar basta-me. Como um menino doente que, às escondidas, abre a janela do quarto e, mesmo quando a chuva e a noite dissolvem a cidade, imagina as bicicletas, o carrossel, piscina, passeio de mãos dadas, cinema... A visão do corpo amado é minha hora mais silenciosa. Para que tocá-lo? Para que escrevê-lo?
Ainda em febre, olho através da chuva. Tremores ínfimos parecem ventos, o rumor do silêncio faz tremer as nuvens, os olhos fechados não prometem menos que o sol.
Afinal, não é um corpo o que vejo assim distante, mas os volumes de uma inteira biblioteca, jamais escrita. Como traduzir o barulho dos cabelos ao vento, as cintilações do escuro acenando nas unhas, a linhagem das orelhas, a prosódia líquida da perna esquerda?
Afinal, não é um corpo, mas uma minúscula tempestade, um oceano encolhido no aquário que qualquer mão brusca pode entornar.
Por mais que estenda o braço, não consigo tocar o corpo de que gosto tanto. Por mais palavras que tenha, não posso escrever este corpo que me dá as costas e se oferece. As palavras nada podem, vacilam entre o espelho e a penumbra. Quando muito, as minhas mãos estremecem e recuam com medo das sombras.
Como cobrir de palavras um corpo que, desde e para sempre nu, parece dançar nas poças d’água e abrir a janela para a chuva?
Simplesmente recordo. Vagueiam na minha mente as imagens, as palavras, os gestos e também os movimentos. Como traduzir para palavras tudo o que o pensamento teimosamente me faz recordar. Impossível será verter em palavras tudo isto.

Fica por mim

Fica
Faz-me esquecer que é noite e que ela acaba
não me permitas adormecer
na manhã perco-me de teus braços
esse meu mundo absoluto que desaparece com o sol

Fica!
não me digas que tem que ser que tens que ir
que amanhã é outro dia
não me abandones na agonia de acordar sem te ter cá

Fica!
deixa que nos descubram juntos
que mal ao mundo virá se eu gritar aos quatro ventos
que não há pecado ou delito em te ter em te amar

Fica!
essa verdade
é fardo leve
que podemos transportar
pensa nos momentos de paz
quando o dia já é tarde
pensa no preguiçar a meu lado
nos pequenos almoços na cama s
em a pressa porque tens que ir

Fica!
não quero viver só a noite
quero que sejas luz solar
acordar em teu abraço
teu beijo meu mundo
que sonho despertar

Fica!
não me lembres que é noite
e que ela tem um fim
não me deixes na agonia
de acordar sem te ter cá

Fica!
fica por mim
que vivo para sentir
as batidas do teu breve coração

Fica!
quero-te aqui para sempre
e não me digas que não

O meu mundo


Da-me a tua mão
Vem comigo
Que vou mostrar-te meu mundo

Da-me a tua mão
E caminha comigo
Que lado a lado veremos a imensidão do universo


Da-me a tua mão
E vê com os meus olhos
Que vou mostrar-te a beleza e a felicidade


Da-me a tua mão
E sente
Que o calor dos nossos corpos se junta Da-me a tua mão

Da-me a tua mão

Deixa-me derrubar as barreiras da visão comum
E mostrar-te o mundo como ele realmente é... Infinito

Da-me a tua mão
E Deixa-me ensinar-te a ver o mar num grão de areia
E o céu num ramo que aflora

Da-me a tua mão

E deixa-me fazer-te sentir o vento
E o perfume que ele nos transmite Da-me a tua mão

Da-me a tua

E deixa-me mostrar-te a importância da vida
E toda a beleza que ela contém

Da-me a tua mão
Vamos correr descalços na relva
E sentir a energia da terra fluir nos nossos corpos

Da-me a tua mão
Vamos ver um pôr de sol
E admirar a arte da natureza em todo seu esplendor

Permite que o sentimento tome conta de ti
Deixando o amor surgir no teu coração

Permite que a paixão que transportas contigo

Seja alimentada por mim...


Permite que eu navegue pelas curvas de teu corpo

Transformando cada pedacinho dele numa jóia rara


Juntos nós caminharemos até á estrela mais próxima

E lá construiremos nosso santuário

Solidão... Saudade... e....

SOLIDÃO, SAUDADE E ....
Aqui
onde não há gente, nem há vida
onde o sol tem medo de brilhar
Aqui
onde as pedras se agigantam contra mim
e o vento não se cansa de uivar.
Aqui
há a solidão que me rodeia a cada instante
há a chuva que cai sem piedade
Aqui
a minha voz que (calada) grita:
estar só é morrer despedaçado.
Aqui
há a saudade que me atormenta sem ter dó
há o teu rosto que me envolve na luz vazia;
Aqui
eu penso em ti
mas de pensar morro de tristeza e de agonia.
Aqui
no meio da solidão
cresce o meu amor e minha ternura,
Aqui
neste monte agreste, nesta terra que não conheço.
gela-me a alma e o corpo
Aqui
á noite, ergo os olhos ao Céu e penso em ti;
só a pensar em ti eu adormeço.
Aqui,
Neste ermo de solidão está tudo contra nós
Nem o sol me aquece nem a lua me brilha
Aqui,
estou eu só
abandonado ao tempo e no tempo
Aqui
neste campo mesquinho e neste chão;
penso em di e na distancia que nos separa
Aqui
Aqui estou euMastigando no coração os dias que me separam do teu carinho

Onde estás...

Onde estás

É meia noite ... e rugindo
Passa triste a ventania,
Como um verbo de desgraça,
Como um grito de agonia.

E eu digo ao vento, que passa
Por meus cabelos fugaz:
"Vento frio do deserto,
Onde está ela? Longe ou perto?"
Mas como um hálito incerto,
Responde-me o eco ao longe:
Oh! Minha querida, onde estás? ...

Vem! É tarde! Por que tardas?
São horas de brando sono,
Vem reclinar-te em meu peito
Com teu lânguido abandono!...
Está vazio nosso leito ...
Está vazio o mundo inteiro.

Thursday, July 26, 2007

No Luar dos..

O Luar....
O que busco no teu silêncio, não é mais do que o desvendar das estrelas
Vestir-me do seu brilho e também beber sua magia.
No silencio dos teus olhos vejo as estrelas brilhantes
Ouço teus pensamentos mágicos e viajo na tua solidão.
O balbuciar da tua voz reflecte no meu sonho Sinto os teus ávidos beijos nascendo dos teus lábios.
Vejo-te nas estrelas brilhando e sinto-te no infinito próximo
A tua ausência é tão presente que sinto teu calor que me aquece.
Busco-te em meus momentos e procuro meu pouso no teu amor
Banho-me no luar dos teus cabelos e sou cativo do poder do teu sorriso.
Como é bom...

Ouço a tua voz, e sinto uma alegria arrebatando-me.

Ouço a tua voz, e sinto uma energia a invadir-me.
Ouço a tua voz, e sinto uma paz doce a percorrer minha alma.
Ouço a tua voz, e sinto um vigor inconfundível e jovial.
Ouço a tua voz, e sinto minha alma envolver-se terna e singela.
Ouço a tua voz, e sinto uma felicidade comovente e ardente.

Como é bom ouvir a tua voz!
Ela encanta-me!
Anima-me!
Revigora-me!
É uma pena só puder ouvir a tua voz!

Quando falo contigo, sinto uma alegria, e ao mesmo tempo sinto um tristeza!
Alegria porque me fazes acordar para a vida.
Tristeza por não a ter junto a mim.
Mas os dias passam e eu vou com eles, na certeza de que um dia vou ver-te,
tocar-te
e sentir-te.

Quando penso assim, olhos ficam marejados de lágrimas,
lágrimas de alegria e de felicidade em pensar no dia que isto acontecer...

Como é bom saber que tu existes...
Como é bom amar-te!
Gostar de ti!
Pensar em ti!

Quero.... Viver.

Quero ser..

Quero viver na tua vida, quero ser uma gota no teu rio, desaguar no mar do teu corpo..
Quero sonhar no teu sonho, acordar nos teus braços, ser a noite que abriga teu cansaço.
Quero ser uma luz no teu dia, um instante do teu presente, a saudade da tua ausência, a felicidade dos teus momentos.
Quero mergulhar no teu mistério, viajar no teu corpo.
Quero saciar a sede dos teus beijos, sentir teu calor, respirar teu perfume, ser todo teu desejo.
Quero sentir a vida que há em ti, partilhar dela cada dia, cada minuto, cada segundo.
Quero ser parte de ti, voar nas tuas asas e sonhar...

Não me culpes

Não me culpes

Não me culpes, por olhar para as estrelas, nem por ver, os teus lindos olhos, brilharem.
Não me culpes por gostar de ver as estrelas, nem dos meus olhos, dos teus gostarem
Não me culpes, por ouvir os sinos, no alto da torre soarem,
Não me culpes, pelos desatinos, que os meus olhos, aos teus cometerem,
Não me culpes por olhar-te tanto, e ficar tão absorvido,
Pois em teu olhar está o encanto, que me faz do mundo ficar esquecido...

Porque simplesmente existes

Para Ti....
Porque simplesmente existes...Pelo sonho tornado realidade Pela certeza que a felicidade existe e está ao alcance da mão, Pelo carinho, Pela espera, pela ternura no olhar, Pela paz conquistada, Pela certeza que o amanhã existe e é real por tudo que me dás Por seres como és, Por te amar assim...tanto...tanto,, Muito obrigado meu sol Muito obrigado meu amanhecer Muito obrigado meu sonho Para ti, só para ti...

Não deixes

Não deixes

Não deixes a minha mão pender vazia, pobre da ausência da tua!
Não deixes os meus lábios secarem, murchos da ausência dos teus!
Não deixes os meus olhos chorarem, lagos de sofrimento, porque te não vêm!
Não deixes a tristeza instalar-se, voltando a quebrar o sorriso!
Não deixes a noite cobrir-nos,
Não deixes a minha mão,
Os meus lábios,
Os meus olhos,
Não deixes a minha mão pender vazia…

Quem és tu?

Quem és tu...?
Que ages carinhosa e viras fantasia,
Deixando-me a pensar todos os dias,
Que me deita e adormece no sonho
De um romance de fadas sem fim...
Quem és tu que me incendeia assim...?

Quem és tu...?
Que me fazes desejar a tua presença
Que me enfeitiça a vos e a mente
Que me rouba o corpo já dormente
Que me faz sentir a vida

Quem és tu...?

Eu viajo querendo o momento do encontro,
Um passeio, uma conversa franca...
O que fazer quando encontrar a tua face?
Roubar-te um beijo, colar um abraço...?
Quem és tu que me leva a todo este embaraço...?
Desejo a tua presença, Enfeitiça-me com a tua voz,
Ah! Como viver um amor distante,
Suportando esta saudade atroz...?

Nos sonhos quando tenho a tua presença,
Estás a sorrir querendo amor,
E quando me beijas sinto o sabor,
Do que guardas no coração...
Acordo então cheio de esperança...
E pergunto-me sorrindo – quem és tu...?

Tuesday, July 18, 2006


PALAVRAS

Palavras são apenas palavras quando não ditas com a alma.
No respeito por isto, e porque gosto das palavras, escrevo-as ditadas pela alma.
Decidido que estou em levar por diante este principio, apetece-me escrever-te.
Escrever-te sem que reprima as palavras mais violentas.
Vou deixa-las sair sempre na sua forma autentica.
Vou deixa-las exprimir, tanto quanto puder, o sentir... o meu sentir.

Obrigado por aquilo que foste, que és e que continuarás a ser.
Obrigado também por seres a luz que ilumina o meu caminho.
Obrigado pelo que me fazes sentir.
Obrigado pelo calor e pela companhia que me fazes diariamente.
Obrigado....
Obrigado pelos momentos, pelas palavras, pelo calor que me deixas trocar contigo.
Obrigado ainda por me deixares amar-te.
Nas ondas onde navego

As tuas palavras vieram florir os meus dias.
A tua doçura soltou-se como o mais suave dos perfumes.

O teu carinho brilhou nos meus olhos.
Estou feliz por ter a tua amizade e por poder partilhar contigo os meus sonhos...
Nos teus olhos vejo o mar,

símbolo de amor e perdição enquadrados num rosto onde sonho,
com amizade e paixão...
Nos teus cabelos vejo ondas, e mergulho num sonho sem fim,
sem horas de regresso à realidade...
Das tuas sábias palavras,

sou um crente atento e apaixonado,
desejando passar de um papel passivo,
a uma acção de um papel desejado...
Posso não conseguir exprimir por acções o que vai no meu íntimo ser,
mas o facto é que gosto,
de contigo eu ser,
ser apenas eu...
eu penso...
ter um horizonte sempre claro na minha vida,
ter a força e a coragem das ondas,
ter um mar de possibilidades de saber,
ter o prazer de navegar em todos os mares do viver,
ter sempre a esperança como leme,
ter a liberdade de voar sempre no meu querer...
Sabes....
sabes

por vezes queria beijar-te
mesmo longe no espaçosei que consentirias
sei que querias
os beijos apagam o desejo
É bom sabermos quanto nos queremos

sem ousarmos sequer tocar nossos corpos
hoje tenho pena por estar longe
tenho pena de não poder percorrer teu corpo
como percorro os mapas
com os dedos teria viajado em ti

do pescoço às mão da boca ao sexo
tenho pena de não poder murmurar teu nome no escuro
acordado
perto de ti as noites seriam de ouro
e as mãos teriam guardado o sabor de teu corpo
ah minha querida
estou definitivamente só
estou preparado para o grande isolamento da noite
para o eterno anonimato da mortemas perdi o medo
a loucura assola-me
preparo a última viagem às Índias imaginadas
disseram-me que só ali se pode descansar da vida
e da morte
perscruto a razão profunda desta viagem
hesito
Sei que por muito longe que me encontre

se pousares a tua mão sobre a minha testa
senti-lo-ei
esse gesto aliviar-me-á de todas as dores
a manhã aproxima-se cortante
ouço barcos largarem do cais
preparo a lâmina
estendo velas em agonia uma lâmina de vidro
para fender as águas imperturbáveis do dia sem bússola
destruo cartas papéis manuscritos outros sinais
destruo imagens que me chamam e me querem reter aqui
releio estas poucas palavras para ti: child of the moon
debaixo das cerejeiras uma serpente antiga adormeceu
em tuas mãos de pétalas lunares
movem-se astros em cima da alba da pele
olharemos os insectos perfurarem a treva da noite
e tecerem claridades
mas não temos mais noite a desvendar
lembro-me
a cidade está cada vez mais rente à nossa separação
Ao fim de uma tarde

que o tempo se encarrega de fazer passar depressa
caminhamos em direcções opostas
ou melhor
eu caminho para norte enquanto tu voltas á tua cidade
a noite aproxima-se com seus territórios de sombra e fábula
areias penumbras oscilantes apagando resíduos de corpos
teu corpo minúsculo arrefece dentro de mim
quando as feras despertam nos olhos abandono-me
à lama colorida dos terrenos vagos
dói-me a voz ao chegar aos lábios
os dedos penetram o metal
cintilam conchas abertas ao sonho
onde terei abandonado a nossa paixão?

Wednesday, April 19, 2006

Hoje Aprendi.....

Hoje aprendi...

Que o maior defeito é o egoísmo,

Que o maior erro é dar-me por vencido,

Que a melhor distracção é a amizade,

Que o maior obstáculo é o medo,

Que o dia mais bonito é hoje,

Que os melhores professores são as crianças,

Que a maior felicidade é a paz,

Que a melhor prenda do mundo é o amor...

Thursday, March 16, 2006

Escuta

Deixa que a luz penetre,
Até ao íntimo do teu coração
E aí...
Escuta bem estas palavras:
Não tapes os ouvidos,
Não temas seus convites,
Talvez esperes de uma resposta,
E quem sabe se dependerá da tua resposta,
O encontro com a felicidade,
Que há tanto buscas e não encontras...
Experimenta,
E verás que a verdadeira felicidade só em ti se encontra
Navego Num Mar de Irinias

Estou perdido...navego num mar de ironias e contradições...Tanto estou feliz como de seguida caio numa tristeza tão profunda que o único alívio que tenho são as lágrimas secas... E choro para dentro de mim... Afinal eu estou apaixonado!
Mas é no choro de lagrimas secas que encontro a minha paz. É assim que consigo levantar novamente a cabeça e seguir em frente...Irónico dirás... Mas é a mais pura das verdades! Quando choro é como se lavasse a minha alma e eliminasse em cada gota um pedaço de melancolia...
Muitos pensam que chorar é uma fraqueza. Muitos pensam que mostrar sentimentos em público é completamente absurdo. Muitos aproveitam-se dos "fracos" que tem a distinta lata de mostrar que sentem, amam, sofrem, choram, riem...
Pois é... os fracos (sim desta vez é sem aspas) são todos os outros, não eu! Aqueles que pensam que esconder sentimentos é uma força? Eu digo, e acreditem se quiserem, que é necessário uma coragem imensa para AMAR! Amar alguém, e não me refiro apenas a paixões entre homem e mulher, implica muitos sacrifícios, muitas desilusões, muitos revés... Mas ao mesmo tempo faz-me sentir dono do mundo, dá-me uma alegria tão grande que às vezes só gritando ao vento é que consigo não explodir... Irónico...não achas?
Todos nós já amamos... De certeza que todos nós já amamos, pelo menos amamos os pais... filhos... mas quantos de nós estão dispostos a proclamá-lo alto e bom som? (endoideceu...interrogam-se todos neste momento...). Não, não estou doido... Atrevam-se...e sintam a leveza do ar a entrar no vosso coração! Sintam o peso de um segredo a desaparecer miraculosamente dos vossos ombros! Partilhem esse amor com o mundo e sintam-se felizes pelo simples facto de estarem vivos!
Eu atrevi-me...e agora sofro...e rejubilo...depende... Ás vezes chega um pedaço de uma palavra para me apetecer chorar... outras um breve passar de imagens na minha mente chega para me fazer rir... Contradições...
Mas de uma coisa tenho a certeza...Não vou negar mais este amor que me assola, que me leva aos píncaros de sentimentos tão extremos, que me faz sentir novamente VIVO! Pelo menos não o vou negar a mim... Irónico... não?
Escrevi.
Porque é que eu precisava de escrever sobre a desilusão? Porque é que eu precisava desse gesto egoísta?
Porque quando a dor me atravessou, quando aquele amor principiava a doer no choro, eu tive a certeza que não poderia manter-me naquele abismo. Aquele abismo que separava aquilo que eu sentia por ela, daquilo que ela sentia por mim.
Eu sabia que tinha de aniquilar aquele amor. Mata-lo. E para o matar, eu só conseguia imaginar uma forma possível de o fazer: quebrar a beleza e o fascínio daquela relação, quebrar os laços de afecto e ternura. E para o fazer eu tinha de destruir a imagem dela dentro de mim. Tinha de destruir a pessoa dela dentro de mim, para poder matar o amor.

A sedução.

A sedução é apenas um convite. Um convite ao abandono mútuo. É o abandonarmo-nos na esperança que mais tarde iremos recuperar esse bocadinho de nós que se foi. Obviamente no outro. É uma espécie de troca directa, entre mercadorias perdidas.
Seduzir é dizer ao outro que temos algo que a ela lhe falta. É estar pronto a dar esse pouco. É, ao mesmo tempo, uma troca; é pedir ao outro aquilo que nos falta. Às vezes, só o corpo. É por isso, que vemos casais por uma única noite. Foi apenas uma transação comercial, não de numerário, mas de carências afectivas. Ele deu, ela aceitou. E vice-versa.
Seduzir é também um jogo. Um jogo de experimentação. É um experimentar de poder - quem tem mais para dar? quem tem mais necessidade de perceber? É um jogo de poder onde um tenta dominar o outro, conquista-lo.
Seduzir é recarregar as baterias do ego. Uma necessidade do egoísta.
Não se cai em contradição quando se diz que, seduzir é um abandono de si mesmo, e ao mesmo tempo, uma necessidade do egoísta. Seduzir, é uma necessidade do egoísta cuja única linguagem que ele entende é obrigatoriamente a do abandono de si mesmo.O egoísta só pode satisfazer a sua necessidade de afecto, se experimentar esse abandono de si mesmo. Apenas porque ele entra em confronto, seduz, outro egoísta. E assim, ambos têm de abandonar-se. Seduzir-se mutuamente.
Tinha uma ave. Uma ave capaz de atravessar os céus.Apenas uma metáfora. A metáfora milenar da liberdade.
Amar plenamente é a prova imaginável e única do altruísmo. Um altruísmo enganoso, obviamente. É o abandonarmo-nos totalmente a outro por uma necessidade interior. Que é a absorção do outro. E, para isso, só nos é possível utilizar uma única linguagem: a do abandono de nós mesmos. A mesma troca de mercadoria, a mesma exaltação do jogo do poder. Dar o que se tem, para receber o que se quer. Esta a lógica mais equalitária. A do egoísta, dar-se o mínimo para receber o máximo.
O egoísmo não é um defeito. O egoísmo também não é uma virtude.
Ser egoísta é como ter dois braços, duas pernas, uma cabeça, olhos, nariz, e boca. É hereditário. Nem é um defeito de fabrico. Talvez seja primitivo para a nossa sociedade civilizada. É inato, como o nosso instinto de sobrevivência.Nem sequer nos é permitido fugir ao egoísmo. Qualquer opção que se faça, mesmo que isso beneficie alguém que não nós mesmos, é uma opção do eu. Uma opção do ego. Optar, escolher, decidir, são acções que remetem ao ego, ao egoísmo.
Amar plenamente é a única prova do altruísmo. Do egoísmo mascarado.
O arrependimento é mais uma prova do egoísmo.
É indiferente se nos arrependemos de ter feito o bem, ou de termos feito o mal. O arrependimento é um olhar para dentro, para o ego. Quando nos arrependemos de ter feito mal a alguém, não nos preocupámos com o sofrimento do outro, ou se nos preocupamos, só o fazemos porque também sofremos com esse sofrimento alheio. Pesa-nos a ideia de sermos nós os desencadeadores desse sofrimento. Arrependermo-nos, é tentarmos expulsar do ego esse constrangimento. É o único modo de mascarar um erro, e fá-lo pelo processo de experimentação que é o da aprendizagem. O aprender da perda.
O egoísmo foi perjurado.O egoísmo é a prova da adaptação do homem à cultura da civilização ocidental.O egoísmo é a forma do homem se transformar em ave. De atravessar os céus. É a sua metáfora da liberdade.
O egoísmo é a solidificação da individualidade. É isso que impede o homem de se diluir na multidão. É a sua garantia de ser único e insubstituível. E isso torna-o um ser potencialmente amado.As pessoas de grande personalidade, de grande carisma, são por um lado as mais egoístas, e por outro lado, as que melhor praticam o egoísmo mascarado
Cicatrizes

Olho-me ao espelho enquanto escovo os dentes, desfaço a barba e penteio os cabelos. Dou-me conta que já moro neste rosto há muito tempo, lembranças, passado. Tenho algumas cicatrizes perto da boca que o espelho não mostra, de palavras que disse, ásperas, duras, expurgando demónios.Que espelho é este, meu Deus, que não lhe mostra nada e me devolve em pedaços?
Ver-me... mas ainda vejo... perto destas cicatrizes pequenas, há outras, maiores, que a insónia sempre redimensiona... estas, das palavras que não disse, as que engasgam em cada tropeço de felicidade, as palavras que penso, as que projecto, as que senti e as que ficaram trancadas na boca, formando sulcos...
Num milésimo de segundo lembro a sensualidade de algumas palavras...e no impulso da hora, tiro a roupa. Olho-me inteiro, acabo criticando, através... Por que o espelho não me dá aquele talho na perna? O que há com estes espelhos? Mas o talho esta lá, eu pude sentir...ele se fez daquela vez em que não obedeceu ao impulso de partir, não ouvi sua vontade de caminhar ao encontro do que achava, ainda, possível...e sempre que escuto as velhinhas na calçada, falando que vai chover, o meu talho arde, como um reumatismo precoce, cobrando os atalhos que usou e os caminhos que não conheceu...
Este corpo que visto... ainda me presenteia sensações, energia... aquela sensualidade crua ainda me faz visitas... Penteio os cabelos... na mão uma queimadura discreta. Onde foi que a ganhei? Lembro-me bem... mas não interessa para o caso. A sobrancelha mostra ainda as marcas da traquinice de menino, do inventor e do audaz. São tantas marcas. Olho-me de novo...sorrio sem querer...Vejo que a vida há já muito me roubou a juventude.
E então, visto-me, num ritual vagaroso e apreciativo. Em cada marca mora um pedaço de mim: pequeno, grande, estriado, não importa...e em cada um exibo-me.
Parto sempre com um sorriso. Uma frase ‘Vai... vai... enfrenta o mundo.’
Afinal, o que há com estes espelhos?
Paciência
Tenho andado muito calado... Apetece-me estar calado... Quando não se tem nada de novo a dizer é o melhor a fazer... Afinal estou perdido. Estou mesmo perdido.
Vou escrevendo... umas vezes com algum sentido... outras nem por isso.
Um caracol entrou na minha vida...e até estou a ser benevolente em não dizer um caranguejo... Explicando... Sabes o que é andar tão devagar tão devagar tão devagar que parece que não se sai do mesmo sítio? É assim que eu me sinto nesta relação com vida... Tenho que admitir que existem melhorias... Mas são tão ligeiras que mal se notam! E eu sempre fui apologista das grandes mudanças, das mudanças radicais. O marasmo desta vida está a perturbar o meu sentido de orientação. Hoje mesmo não me percebo. Será que isto me acontece porque me apaixonei?
Paciência é a palavra de ordem neste dias que correm... que raio de palavra, de qualidade para se invocar numa altura destas...! Apre! Não podia ser antes loucura? Paixão? Amor? Raiva? Algo que significasse e implicasse acção? Tinha que ser algo tão monótono como paciência? Se há qualidade que me irrita profundamente é esta... aquelas pessoas sofredoras que preferem esperar para ver do que agir, gritar e estrebuchar...deixam-me zangado e estupidamente confuso... É aquele tipo de coisas que diferencia os santos dos demónios...e eu sinceramente prefiro a segunda hipótese...
Nunca fui muito paciente. Sempre fui do tipo de querer tudo rapidamente, mas que também sabe esperar. Ter que esperar para ver, não participar, não lutar, não é mesmo comigo. Comigo ou é ou não é... E agora, 46 anos depois de ter vindo ao mundo, é que tenho que saber esperar? E que faço eu com toda a bagagem que fui acumulando ao longo deste tempo todo e que me ensinou a não esperar porque se desespera? Como ajo agora? Esqueço todos os velhos hábitos e procuro ser paciente? É que eu até tenho andado a tentar... E pareço uma avestruz a tentar dançar balet... É mesmo de morrer a rir! Quem está de fora a observar está mesmo a gozar o pratinho...
Na realidade estou a desgastar-me à velocidade da luz...Como mal, durmo mal, tenho pesadelos e sonhos absurdos, ando irritadiço, calado, muito pouco condescendente e mais uma série de coisas dignas de novela mexicana dobrada por brasileiros que nem português correcto sabem falar...Tanto estou eufórico como completamente em baixo, alegre/ triste, simpático/ antipático, tímido/ atrevido, brincalhão/ sério que nem abade em dia de missa... É uma montanha russa autêntica com loopings e parafusos num nunca mais acabar de voltas pois alguém se esqueceu onde era o botão de desligar... E já estou com vontade de vomitar pois não há estômago que aguente tanta reviravolta... e não tarda muito aproveito uma daquelas alturas em que estou de cabeça para baixo e desaperto o cinto de segurança que me prende ao assento e deixo-me cair...
O que me aborrece é que eu a adoro. Gosto muito dela. Caí que nem um patinho. Apaixonei-me loucamente. Simplesmente quero que isto não acabe nunca. Ficar com ela mesmo que seja aos bocadinhos, longe ou perto, isso é o que me interessa. E sempre que penso em mandar tudo às urtigas fico ainda pior do que uma série de 3 voltas ao quarteirão... Sou fisicamente e psicologicamente incapaz de o fazer...
Paciência...Dai-me paciência...
Juro que já não me entendo... Uma coisa eu sei... Vou lutar até ao fim. Quero lutar porque gosto muito dela e não a quero perder.
Perceber isto já é um exercício de paciência.
A censura

A censura da consciência pesa pouco diante deste pensamento.
Uma palavra, uma careta, um olhar frio é suficiente para remeter qualquer pensador ao seu isolamento mais profundo.
O que sabemos de nós próprios, o que os outros sabem de nós, o que a nossa memória reteve, não é decisivo para a nossa felicidade.
Dou-me conta que a opinião essa sim é forte e poderosa.
Todos ficamos sempre melhor com a má consciência do que com a má reputação
O que vejo eu...
Vejo-te sair do mar, dourada, húmida, atenta ao clamor silencioso que produzia a tua imagem.Não esquecerei o teu corpo nu. A memória faz-me voltar, todas as tardes à praia onde a espuma te queria acariciar os joelhos dulcíssimos, onde o sol beijou o teu corpo nu. E recrio-te no ar, parado.
Não esqueço o teu corpo desejável, as tuas coxas reluzentes, os teus seios ... Não esqueço o calor do corpo... Não esqueço...

Entreguei-me às esferas áridas, frias, das ideias, buscando o refúgio que a tua pele agora não me oferece. Nesta ria, onde os moliceiros sobem e descem, onde os pescadores dão banho á minhoca na esperança de uma boa pescaria, fico sonhando uma praia distante.
Vejo-te agora também, deslumbrante e doce. Quero apagar por momentos a tua imagem. Mas em vão.
Não esqueço o teu corpo de água ardendo.
Não esqueço o momento.
Nos livros, onde tento refugiar-me, não vejo mais do que as tuas linhas.
Segredos

Segredos são beijos ternos que suavemente se segredam ao ouvido a quem nós queremos que nos conheça e nos ame...
Poemas são o mar da vida que derramamos no papel, como a onda que beija a praia em que nos confessa seus amores em cada maré.
É como o oceano, vivemos entre algumas tempestades e acalmías, seremos felizes portanto apenas por navegar, porque só quando chove e faz sol vemos o arco iris feito muitas vezes com a água das nossas próprias lagrimas e com o brilho do sol que todos trazemos na alma...
Pensamento
Amor é o que foi e ainda o que está para vir.

É querer alguém, deseja-la e possuí-la.
É viajar através de obstáculos, ultrapassando-os e nunca deixando que eles nos passem à frente.
É a vontade de ir ao encontro do outro: meigo alegre e compreensivo.
Devastação...
Falta-nos uma alma desejada e tudo fica despovoado, num silêncio afogado dos nossos choros em espasmos de soluços...
Talvez sejamos felizes quando nos completarmos a nós próprios.
Até lá, as lágrimas continuarão a escorrer.
Zezinho

Tuesday, December 13, 2005




O momento

Falta no máximo meia hora para que a noite acabe; ainda tenho algum tempo. O Sol não deve tardar aí. Começa-se agora a notar aquela estranha claridade que anuncia o nascer do dia. Olho á volta. Ali o mar e as dunas. Do outro lado a ria. Tudo é belo nesta estranha claridade. Suspiro e fecho levemente os olhos, tento rever aquela imagem no meu cérebro. Tão belo! Volto-me para dentro e sento-me de pernas cruzadas no centro de mim próprio. Fico uns momentos assim, de olhos fechados, meditando. Sinto o calor do teu olhar, o cheiro do teu corpo... estou aqui contigo.
O frio e a humidade são medonhos, atravessam-me os ossos. Abro de novo os olhos. O silêncio é total, mas eu sinto que o sol está de volta. Tenho pouco tempo, agora. Erguendo a voz bem alto, eu falo, certo de que alguém me olha e me ouve. " Perdoa-me, minha querida! É teu o meu coração (bem o sabes), mas a minha alma está geminada à do Sol — não há nada a fazer..."
Volto a olhar para dentro de mim. Em alguns instantes apenas, o espectro azul estará aqui. Na solidão adimensional do Limbo, revejo os momentos, a história de umas horas. Nunca serei capaz de ultrapassar o momento.
Quando o meu espírito recupera do vazio anil em que se encontrava, o Sol já nasceu. À minha frente, já não está a linda mulher de azul. Estou apenas eu e o mar, o sol e a ria.
Estou feliz, mas não consigo mais do que sorrir levemente: os músculos da minha face não respondem; também não sinto o corpo...
... mas estou feliz.
Os cacos da vida

Vou lamber delicadamente minhas lembranças, vou banhá-las todas com o sal amargo das lagrimas, vou prepará-las para o voo do esquecimento. Vou acalentar os sabores e sonhos perdidos como se nunca tivessem partido. Vou rir como se nunca houvesse existido. Vou carregar presságios pela vida afora (que nunca se hão de cumprir) como se fossem a certeza da sina - são o virtual.
Vou acreditar no que sonho e vou desejar, ardentemente, o impossível, como se alcançável todo o tempo.
Vou andar com a cadencia certa e acreditar, piamente, que é minha a marcha, criação do passo - vou acreditar no livre-arbítrio.
Mas vou porque preciso, porque me falta tacto para o engano; vou porque senão afundo neste poço sem fundo. Vou tanta coisa... que nem sei o quê.
Do que faço pouco me sei. Só sei que nada faço. Faço o que não quero e não faço o que quero.
Palmilho este velho chão de feridas; retiro as crostas destas feridas invisíveis sem gemidos, e sorrio. O que me resta, afinal? O que ainda me sobra ainda? Nada, nada me resta neste caos,
Mas não consigo nunca desligar-me de tudo; há relíquias que mantenho firmes dentro de mim, referências necessárias - coisas boas, boas pessoas. Os pânicos vou dispensá-los, Ah, bem preciso!... Os receios, as auras de falsa protecção, as dores sem respaldo, os horrores, as lembranças amortecidas, os desejos enrijecidos...
Ah, quero os beijos dela agora!... Ah, quero as suas caricias agora!... Ah quero sentir o calor do seu corpo agora!... Ah... quero os passos hesitantes, a marcha sombria de um pânico cego.
Ah, tudo o que quero enterrar pelo caminho! O tanto que desejo dispensar antes que me pareça ainda mais tarde - tão tarde!...
È tarde... voltei a perder.

Monday, December 12, 2005

A Aliança atenta dos silêncios.

É uma criatura esplêndida, carregada de charme, segura de si, altiva. Por trás da sua capa vê-se uma doce, meiga, capaz das maiores aventuras. Dou comigo a olhar para ela, contemplativo, e ela sabe-o, sente-o. Deixo de olhar para ela e ela vira os olhos para mim. Eu sei-o, sinto-o .
É uma vaga por entre o silêncio.
É uma mulher que seduz sem palavras, por isso possui uma arma temível. Por trás daquele olhar, incrivelmente palavroso, fixo aqueles olhos verdes, lindos, tão expressivos e serenos. Parecem vazios de expressão mas com o seu sorriso aberto dizem tudo o que queremos saber.
O seu corpo, o quadril, o porte da cabeça, o brilho dos cabelos, os joelhos, ai os joelhos, as pernas, a cintura, as formas bonitas, os seios, os gestos graciosos, tudo nela produz encanto que admiro, por vezes como uma certa grosseria.
Peguei-lhe na mão, nos dedos finos para poder sentir o calor do corpo. Senti carinhosamente as mazelas provocadas pelo mau funcionamento orgânico. Senti o calafrio natural de quem gosta. Ela engole-me na sua magia. A alquimia do encontro não acontece. Mas sinto-me perto, sinto-me bem, sinto-me sereno.
Para vê-la preciso saber olha-la em silêncio. Sinto que gosta de ser acarinhada, contemplada, gosta de estar rodeada de atenções e afecto.
A nossa aliança baseia-se na cumplicidade atenta dos silêncios. Em silencio saberá descobrir e saberá enroscar-te no meu amor como se uma roupa aconchegante vestisse. O enroscar de uma serpente que de forma lenta e dócil apertará o meu corpo, esmagando-o e dele extraindo todo o calor.
O dia chegará em que na cumplicidade atenta dos silêncios, a verdadeira beleza do amor se fará graça e esforço, dádiva e conquista permanente.
O silêncio que se seguirá dirá tudo sobre a qualidade do prazer, ou das frustrações, sobre a verdadeira satisfação dos amantes, da sua eventual regeneração e da sua harmonia, nua.
É sempre um prazer estar com ela mesmo no silêncio.
Fascínio

Essa mulher, que tanto fascínio exerce sobre mim, tenta compreender-se desesperadamente, tenta amar-se entre fúria e desordem, busca o (esquecido) gosto doce das lembranças, a custo arrancadas da memória.
Essa mulher, que aos primeiros sorrisos parece simples, de fácil compreensão (e digestão), desgarra suspiros profundos da alma, arranha-se por dentro como fera selvagem, sofrendo por dores que não compreende, e ansiando absoluta pelas que desconhece.
Ai, essa mulher que dói a linguagem do amor, sua necessidade premente (antídoto da loucura) e sua ausência sofrida;
Essa mulher que arde fogueiras solitárias; cujo coração compassa, absurdo, no ritmo das esporas de um cavaleiro que perdeu o sentido de caminho inevitável...
Essa mulher que deseja e tripudia os próprios desejos; que sonha e repudia ao mesmo tempo; que acredita (tanto!) e se engana, sinceramente; essa mulher que me fascina e tem medo...
Não! essa mulher não é tigresa afiada, megera indomável, fera cobiçada!
Essa mulher é bicho assustado, é corpo fechado; é medo intocável!
Porque se lhe roçam a pele, os pelos se eriçam, - mas quem a liberta?
Porque se lhe beijam a nuca, sussurram ao ouvido, ou tocam os seios, - o corpo estremece; mas quem reconhece? (quem a conhece?)
Quem? a se dar o trabalho de despir essa nudez tão criteriosamente coberta pelas ilusões (tantas) alheias; vestida, meticulosamente, palmo a palmo, pelos erros fáceis de quem se contenta em olhar sem enxergar com clareza? Pelos deslizes de quem se nega o mergulho, - porque o fundo (não) se vê, não significa que é raso; assim como nem tudo que não tem fundo significa afogamento...
Quem vê? Quem? para a despir, de corpo e alma?
Quem? para lhe dizer: amo-te, e deixa-la acreditar, livremente, simplesmente, como se tivesse sido fácil desde o início dos tempos...
Onde? o lugar que perdeu, mas seu coração ligou-se de maneira incompreensível, numa curva obscura do túnel do Tempo e das Gerações, de onde não se conhece mais nada, de onde não sobra mais nada, de onde não voltará jamais!
Quem, por deus!, a vai despir de si, para lhe contar, um dia, que foi melhor assim?
Ah, um espelho que não a minta tanto, implora! um sorriso que não esconda tanto quanto se pensa que expõe; um olhar que não fixe tanto em sua cor, apagando o esgazeado da dor, um...
Mas para quê? se não é nela, nem agora. Para quem, se não acredita no que acredita? Porquê? se o que quer não se alcança, se o que oferece não se busca, se o que libera não se adivinha, se o que expõe não se compreende... se nega tudo!
Quem, para a despir, de corpo e alma?
Quem...

Wednesday, November 30, 2005

O Rio

Ouvir a lenta caminhada de um riacho rumo à foz pode ser um dos exercícios mais salutares que um homem pode encontrar no seu período de vida. O som cristalino das gotas de água a bater nos seixos de um leito baixo, faz avivar recordações de menino.
Recordações de um tempo em que a pureza existia por si mesma, sem adulterações, sem concessões! Onde nessa pureza, não se punha em causa a sua inexistência eterna e permanente! Assim, o Homem depois de adulto, não consegue nunca voltar a esse estado ancestral, violento e belo de pureza, mais não seja porque vivendo-o, sabe que a impureza existe.
Para uma reunião prolongada, daquelas em que dois litros de água e dez cafés não chegam para suavizar, visitei um destes dias, uma fábrica de componentes electrónicos. Tinha que recolher informação para a elaboração de estudo e um diagnóstico de situação. Para quem não sabe, estes estudos servem para o aconselhamento das empresas no sentido económico e de investimento. Esta definição tem muito que se lhe diga, mas ficará para outra altura. Acontece que essa fábrica fica ao pé de um dos rios mais belos que conheço. Estava eu quase a chegar ao meu destino quando para infortúnio meu, o meu carro, que já pede substituição há bastante tempo, resolveu rebentar um tubo de óleo, provocando um ligeiro princípio de incêndio. Parei numa estada deserta e telefonei para o reboque. Muito diligentes informaram-me que provavelmente o dito demoraria duas horas. Coisas que acontecem nestes seguros que têm assistência em viagem.
E eu ali perdido, com horas marcadas para a reunião (com meia dúzia de titulares de cargos pomposos), numa estrada, que não fosse de uma zona que muito gosto, apelidaria de parideiro perdido no tempo. A última coisa que me faltava agora era perder aquele tempo e o cliente e seu staf à espera. Telefonei-lhes a explicar a minha situação e telefonei também para a empresa a avisar que provavelmente me iria demorar mais um dia naquelas paragens.
Entretive-me nestes afazeres, não mais do que dez minutos, o que deixava ainda muito tempo para matar. Como ainda não tinha conseguido livrar-me da sujidade toda do incêndio, decidi fechar o carro e ir de encontro ao rio que ouvia distintamente no silêncio. Quando finalmente ultrapassei a orla de choupos que ladeavam o rio deparei como um dos mais belos espectáculos da minha vida.
Perante mim estendia-se um espelho de água de grandes dimensões, ladeado por salgueiros e choupos. O único ruído era o da pureza da natureza, ouvia rãs em seus cânticos amorosos, as pequenas libélulas a zumbir, nas suas danças de vida e morte e acima de tudo ouvia a água. Uma pequena represa obrigava o líquido a contorcer-se e a deixar a quietude do espelho de água e a produzir um ruído cristalino que inundava os meus ouvidos. Sentei-me um pouco, num rochedo enquanto me limpava, e fui um espectador privilegiado de um recital que a natureza me ofereceu.
Aí recuperei um pouco da minha infância, da minha pureza e do meu enorme gosto pela vida. Foram instantes que nunca esquecerei.
Claro que resta dizer que quando voltei para o meu carro, o reboque já esperava por mim há 4 horas, que no dia seguinte não consegui acabar de recolher os elementos para o trabalho que teria de levar a cabo. Claro que todos aqueles senhores, com títulos pomposos estavam prontos a devorar-me. Tive vontade e cheguei mesmo a dizer que, naquelas condições não faria o tão almejado trabalho.
Perguntam-me porque o fiz, o que realmente se passou naquele dia alguns meses atrás. Eu respondi: Alguns meses atrás vi uma sereia encantada, uma moura que num poço sem fundo cantava as mais doces canções árabes de amor. Era uma voz de menina, mas amadurecida pelo saber e pelo calor de um deserto em que naveguei. Encontrei um sentido e um caminho. Apaixonei-me pela sua voz e o seu encantamento foi de tal ordem que tudo o resto me pareceu irrelevante. Foi como morrer para depois renascer. Hoje sou finalmente um Homem realizado. Vi a luz que tantos buscaram em batalhas e conquistas de sangue e descobri que o maior pecado do Homem é o esquecimento. O esquecimento das coisas simples e belas do mundo. Enquanto estive ali sentado, ouvindo o sussurrar daquele leito de felicidade, tudo se transformou em mim. Deixei para trás um passado em busca de um outro mais longínquo. Recuei à minha própria fecundação, onde por desígnios superiores fui concebido, regressei ao leito de minha mãe e me encontrei com seus seios. Deliciei-me nesse leite de cristalina pureza e compreendi que o objectivo não é não ter objectivos. O objectivo é regressar à simplicidade do belo, das pequenas coisas, sem exigências, sem confrontos, sem compromissos. Na beleza nada é passível de ser perdido ou esquecido. O todo torna-se belo de per si, não por parte dele nos agradar mais, ou menos.
Apenas querer
Eu quis um dia saber cantar, ouvir sons cristalinos da voz delirante, nos espaços pendurados dos raios de estrelas, nos fragmentos de nuvens, nos olhares das mentes que se elevam para além do ser.
Eu quis um dia viver os sonhos começados...
Eu quis um dia saber falar, ouvir-me na voz e na vida, em opinião respeitada, admirada, profunda, meditada.
Eu quis um dia que a voz falasse calada, que se ouvisse sem ter som.
Eu quis falar com o saber, onde o saber fosse olhar ou tão somente sentir.
Eu quis saber falar ao espelho, olhar nele o eu que sou, sabendo que nunca seria, ou mesmo que nunca me veria tal como apenas sou.
Eu quis apenas saber falar de mim. Olhar-me reflectido como se esse eu mostrado não fosse o eu transportado em suporte físico comum, de corpo matado de senso ou isento de ausências presentes.
Eu quis um dia ouvir e fazer-me ouvir no silêncio das palavras.
Eu quis um dia saber ler através dos teus olhos, conhecer o teu sentir, mergulhar na tua alma e aí permanecer.
Eu quis um dia saber andar, caminhar com passos leves, pisando bolas de algodão semeadas por carreiros e veredas dum horizonte fugidio.
Eu quis um dia não andar apressado, sem ter metas previstas nem linhas de partida marcadas.
Eu quis saber andar pelas estradas, desviando o corpo das máquinas que não controlo, enroladas em saberes que não domino, doidas de loucura crescente, ocultas e perdidas no meio de reflexos matinais em madrugadas que só vi ao entardecer.
Eu quis um dia saber sentir, saber do teu sofrimento e das tuas alegrias, que se calhar não vi por não querer.
Eu quis um dia ver o que não sou e que me parece que nunca o serei.
Eu quis sentir o que sentem, aqueles que não possuindo apenas pedem para ter, aqueles que não vendo apenas querem olhar, e aqueles que não rindo apenas querem sorrir.
Eu quis sentir o outro em mim, aconselhar-me em luzes fugazes de frestas enrugadas de rostos doridos de sofrimento de dor e de sofrimentos sentidos como penso que não sinto.
Eu quis um dia saber olhar, levantar os olhos do chão, ver ao longe e ver ao perto.
Eu quis abrir meus olhos ao espaço e por entre postigos inquietos de portas sempre fechadas em casas que não se abrem, saber dizer o que vi saber contar o que senti... sentindo o que contei. E sobretudo olhar ao longe que ao perto já se vê, quando o perto é muito perto, é mais fácil de olhar mas mais difícil de ver.
Eu quis um dia saber amar, saber sobretudo falar aquilo que gostava de ouvir sem ser preciso pedir ou sem ninguém me dizer: Que bom seria se dissesses ou que bom seria se quisesses, apenas querendo dizer.
Eu quis um dia saber se amar é conhecimento adquirido ou saber só aprendido, ou sentimento cultivado em terra lavrada de pranto por tantos medos sentidos e tantos amares perdidos por vergonha de dizer, ou por ausência de querer.
Eu quis um dia sonhar, saber olhar, saber ver, saber falar, saber cantar, saber andar e sentir
Eu quis um dia saber amar também.
Eu quis que o meu sonho fosse o canto, a minha voz o caminho e o meu amor sentimento, em canção que fosse sonhada, em fado que fosse amado e em caminho que fosse sentido.
Eu quis amar como se olha, ou sentir como se canta, e andar como se fala.
Eu quis ter voz, ter saber e olhar à minha volta, vendo a voz e vendo o fado, querendo que o fado querido, fosse o olhar que me faltou e a voz que nunca tive, no saber sentir...
Falhado, no saber andar... Perdido, no saber amar... Escondido no saber ser destruído... Por apenas querer Ser... Por apenas te querer amar
Eu quis ver o entardecer antes do amanhecer
Eu quis ver o amanhecer antes do entardecer
Eu quis ver... Eu quis sentir... eu quis apenas viver

Daqui, deste lugar, não te posso ver, Daqui, deste lugar, não te posso tocar, Daqui, deste lugar, não te posso beijar, Daqui, deste lugar, não posso olhar dentro dos teus olhos Daqui, deste lugar, não posso adivinhar o que eles estão a tentar me dizer...
Mas, daqui deste lugar, posso sentir, posso sonhar,
Posso lembrar-me do calor e do carinho que trocamos.

Caminho

Por entre os estranhos caminhos de mim
procuro nas ruas e vielas labirínticas do pensamento
os destroços de uma caravela imaginada.
Perdido nas sombras do mar, às vezes calmo, às vezes tempestuoso,
voga a minha barquinha sem tempo num oceano de palavras.
As palavras de água juntam-se e fazem poemas,
às vezes roubam-me o personagem que eu tinha imaginado,
esquecido nas ruas sombrias desse mar, à espera de um nome,
à espera de um lugar.
No segredo das coisas secretas que guardo em Segredo

O momento

Falta no máximo meia hora para que a noite acabe; ainda tenho algum tempo. O Sol não deve tardar aí. Começa-se agora a notar aquela estranha claridade que anuncia o nascer do dia. Olho á volta. Ali o mar e as dunas. Do outro lado a ria. Tudo é belo nesta estranha claridade. Suspiro e fecho levemente os olhos, tento rever aquela imagem no meu cérebro. Tão belo! Volto-me para dentro e sento-me de pernas cruzadas no centro de mim próprio. Fico uns momentos assim, de olhos fechados, meditando. Sinto o calor do teu olhar, o cheiro do teu corpo... estou aqui contigo.
O frio e a humidade são medonhos, atravessam-me os ossos. Abro de novo os olhos. O silêncio é total, mas eu sinto que o sol está de volta. Tenho pouco tempo, agora. Erguendo a voz bem alto, eu falo, certo de que alguém me olha e me ouve. " Perdoa-me, minha querida! É teu o meu coração (bem o sabes), mas a minha alma está geminada à do Sol — não há nada a fazer..."
Volto a olhar para dentro de mim. Em alguns instantes apenas, o espectro azul estará aqui. Na solidão adimensional do Limbo, revejo os momentos, a história de umas horas. Nunca serei capaz de ultrapassar o momento.
Quando o meu espírito recupera do vazio anil em que se encontrava, o Sol já nasceu. À minha frente, já não está a linda mulher de azul. Estou apenas eu e o mar, o sol e a ria.
Estou feliz, mas não consigo mais do que sorrir levemente: os músculos da minha face não respondem; também não sinto o corpo...
... mas estou feliz.

Saturday, November 19, 2005

SAUDADE.
Tu partiste e eu fiquei, nesta terra de amargura e incerteza, abandonado às tempestades de areia morta.
Em ti pensei e em ti penso, no teu rosto e no teu sorriso tão querido, nos teus olhos, que um dia se fecharam tal qual estrela no céu se apaga!
Por ti chorei e por ti choro, pela ternura que me deste, pelo amor com que me verteste, pela vida que me deste. Na tua ausência e na do teu amor
Aqui, sou eu , cínico e egoísta como todos. Lá, és tu, a pureza e a verdade de quem nasce.
À noite, quando me deito e beijo na distância o teu rosto, rasgo o silêncio das trevas que me envolvem e trago-te até mim em pensamento.
Para mim, serás sempre uma lembrança viva, que não morreu e que se manterá sempre viva. Dessa inconsciente criança que deixaste, do menino mimado não resta nada! Hoje, sou o homem, o pecador! Hoje sou o homem que segue os teus conselhos.
Sei que me olhas do Paraíso onde te encontras e que me sorris, apesar de te não ver, ou que choras por não ser aquilo que desejavas. Não fui nem nunca serei. Nunca fui tão forte como tu. Mas sabes que tento, sabes que tento ser justo. Sabes que me esforço. Sabes que luto. Sabes que tento viver dando o pouco que tenho.
Perdão por tudo e pede que um dia te encontre como se daqui jamais tivesses saído.
Meu bom amigo... tenho saudades.
Para ti pai amigo
Estamos perto do Natal. Hoje faz um ano que tu partiste. Faz hoje um ano e alguns dias que te levei até á tua ultima morada nesta terra. Agora sei que vais vigiando as coisas aí de cima para que tudo se mantenha como tu gostas. É nesta altura do ano que estás ainda mais próximo de mim, e fazes-me lembrar que devo continuar a manter a tradição do Natal viva. Neste dia todos estávamos contigo, vivendo os espirito do dia e principalmente da família que sempre te deste ao luxo de ter contigo. Conseguias sempre reunir esta tropa toda e ficavas feliz. Eu vou cumprindo como posso, mas tu fazes falta junto de nós, mais que não seja para fazer o controlo das operações. Sempre gostastes dessa função. Mesmo quando não te mostravas nós sabíamos que nos estavas a controlar e que não deixavas nada ao acaso.
Para que tudo se mantenha como gostas, sabes que o bacalhau já está de molho, o cabrito vem a caminho, as couves chegarão no momento próprio. Este ano decidi fazer bacalhau assado na brasa em substituição do bacalhau cozido. Sabes aqueles panelões grandes acabavam por transformar as batatas quase em puré. Vai dar mais trabalho do que costume, mas o que é isso para quem está folgatito. Não sei se o pessoal vai gostar, mas vai ser diferente. Lá terei que fazer um esforço para mostrar os meus dotes de cozinheiro. A Bety vai estando comigo e espero que saia tudo bem.
Como sempre, mantendo a tradição, mandas-me para as compras com uma lista interminável de prendas. Os teus netos fizeram chegar as cartinhas para o Pai Natal. Sabes como é, cada um fez uma lista igual aquelas que levamos para os supermercados. Vamos ver o que consigo fazer com o orçamento que tenho. Falta tão pouco tempo e eu ainda não comprei nada. Também é verdade que somos poucos. Trinta e dois ao todo, mais um ou outro amigo que nunca deixamos sem prenda neste dia. Vai ser um tal viajar, fazer umas birras, (sabes que faço sempre) dentro dos hipers e centros comerciais. Tens que organizar as coisas para eu passar a pasta a outro. Já lá vão vinte e seis anos a fazer esta mesma tarefa. Tens que me poupar um bocado porque começo a ficar velhote para isto. Começa a ser difícil achar graça ás barbie’s, aos nenucos, aos jogos do pokemon... todas essas coisas que a canalha quer.
A tua Maria tem-se aguentado bem, e continua a fazer aquilo que tu fazias. Mantém as arcas cheias de coisas e diz que não sabe o que vai fazer para alimentar as tropas. Agora já não sei se eras tu que tinhas a mania de ter tudo em casa ou se era ela que te ia fazendo dar as voltas pelos supermercados. Vícios antigos, não é pai. Coisas que eu se calhar também faço e nem noto.
Acabei as compras, falta qualquer coisa, mas amanhã também é dia. Tu sabes que sempre nesta altura a minha vida fica um martírio, porque tenho que organizar o jantar com o pessoal na empresa, o lanche para os filhos dos funcionários, eles também gostam de uma prendinhas que eu tenho que comprar de acordo com a idade deles, tenho também organizar as coisas para a ceia de natal e para o almoço, lanche e jantar no dia de natal. É assim todos os anos e este não vai ser diferente.
As tuas meninas começam a chegar amanhã, e este ano vamos estar todos á mesa com apenas uma excepção. O Carlos e os filhos não estarão á mesa. Mas eles vêm depois do jantar para a distribuição das prendas. Sabes que não quero falar disto. Não te vou dizer nada a este respeito porque me faz mal a mim e a ti.
Se estás atento já viste que estou de rastos, depois destas horas todas na grelha a assar o bacalhau. Foram-me trazendo cervejinha fresca para ir ajudando. Tenho que ter cuidado, senão apanho uma carraspana e lá se vai o bacalhau. Este ano nem vou ter com o grupo de costume ao café para bebermos a cervejinha da noite porque não tenho tempo.
Os teus netos apareceram aqui agora e já me fizeram chorar. Sabes que não sou dessas coisas... chorar... mas olha... é assim... estou a ficar velhote... ou será que foi do fumo deste fogareiro?
A assada do bacalhau está pronta, e agora vamos lascar o bacalhau, as batatas já estão meias cozidas, vamos juntar umas rodelas de cebola e algum tempero, muito azeite e vai tudo para o forno. Tenho pena que aqui não estejas para provar.
Como sempre está todo o mundo na cozinha e fazem uma barulheira infernal. Um grupinho aqui, outro ali. Tu sabes como é. A tua Maria vai dando corda e este e também aquele, e anda contente por ter novamente a família junta. O teu genro trouxe o vinho. Nessas coisas ele é bom. Vamos ver se chega.
O jantar está pronto, são nove da noite, as tuas filhas e netas já puseram as mesas na cave, aquela onde nos sentamos sempre todos, e vamos começar a atacar. Vais fazer muita falta, mas iremos todos fazer uma força para que não seja muito doloroso.
O jantar estava delicioso, modéstia á parte, mas sobrou muita coisa. Sabes como sou... para mim nunca chega. Isto não é novidade para ti, foste tu a ensinar-me a ser assim. O vinho chegou. Para não variar, a desgraçada da tua filha que tem o asar de se sentar a meu lado nessa noite bebe sempre um pouco mais. Este ano a Eduarda está simplesmente divinal. Fala pelos cotovelos (já é ela e o vinho a falar), e palpita-me que vai chamar pelo gregório. Não faz mal ela está linda.
As tuas netinhas foram buscar o café e a respectiva garrafa do cheirinho com gelo. Falta saber quem vai levar os carros para casa, mas... depois se verá.
É neste momento que nos fazes mais falta. Lembro-me de te juntares aos teus netinhos com a tua Maria e ali ficarem durante cerca de duas horas a assistir a distribuição das prendas, á excitação da canalha e ao teatro que eles todos os anos nos brindam. Este ano foram os mais novos a fazer o teatro apoiados e organizados pelas netas e netos mais velhos. Estão a ficar profissionais.
Um dos teus filhos vai-se vestir de Pai Natal, este ano é o Fernando que cada vez está mais careca, para começar realmente a festa para os teus netos. Vai começar a saga das prendas... as perguntas normais – para mim não há nenhuma? Os ajudantes do Pai Natal (o teu neto Jorge e o Nuno) lá vão escolhendo as prendas para eles não ficarem excitados. É um tal rasgar os embrulhos. É bom ver a expressão deles quando começam a aparecer as cozinhais que tinham pedido ao Pai Natal. No meio disto tudo, vai-se bebendo mais um copo, e mordiscando mais qualquer coisa para ir amparando o estômago.
Com isto tudo, dou-me conta que são duas da manhã e que tenho que me levantar relativamente cedo para preparar a caldeirada. O teu filho Carlos que normalmente se encarregava da caldeirada não vai estar e por isso lá vou eu novamente. A sorte é que as tuas filhas descascam as batatas, as cenouras, e as cebolas, limpam os pimentos e os tomates. Assim á mais fácil para mim depois.
Bem, doem-me as pernas. Custo-me muito a levantar. Penso que ainda tenho mais álcool no sangue do que quando me deitei. Também dormi pouquito. Foi um semana e pêras num corre corre para que tudo estivesse á altura do dia, mas lá vou eu para começar a preparar a caldeirada. Fica sempre boa. Entretanto lá foram as pernas do cabrito para serem assadas. Vão fazer falta para noite.
Verificamos que o vinho que o teu genro trouxe tinha acabado. São todos uns bebedolas estes teus filhos, e principalmente as noras e os genros, não se admite que ele seja tão sumitico que não traga vinho suficiente. Por isso fomos ver o que tinhas na garrafeira. Eu tinha comprado o espumante tinto para o cabrito, mas como nem toda a gente gosta lá tivemos que assaltar a tua garrafeira.
Depois de devorar o almoço e beber uns copitos fiquei com uma soneira e resolvi ir para casa dormir. A Bety também estava de rastos. Ás sete horas voltei para o lanche ajantarado. Sabes que a esta hora começa a apertar novamente a sede. Vamos beber cerveja agora porque senão ninguém nos levanta amanhã.
Amanhã voltamos todos para comer a roupa velha. Por este andar mais valia ficar aqui o resto da semana.
Custou um pouco passar sem ti... mas olha que cada um fez o melhor que podia para te ter sem que os outros percebessem.
Tenho saudades tuas meu bom amigo.
Sonhos apenas...
Nestes últimos dias tenho tentado separar o corpo do coração e o coração da alma.
Quando penso que poderíamos ser dois corpos e duas almas num só, as lágrimas teimam em surgir. Pela mágoa. Por desconhecer o tempo exacto da vida. Por desespero.
Tenho odiado as palavras. O som oco que elas projectam na alma e o eco profundo que causam no coração. A ressonância que elas provocam no corpo... O som das sílabas a impor-se ao som ritmado do coração; o coração a bombear, incessantemente, sangue e o sangue a percorrer a dor da distancia do teu coração e do teu corpo (que se tornaram, entretanto, independentes e distantes do meu).
As palavras não conseguem exprimir um pedacinho, por mais pequeno que seja, daquilo que sinto...
Ouviste o meu chamamento, ainda há pouco?
Sentis-te a resignação que me invadiu quando o som repetitivo do telefone te chamava sem resposta? Não porque não o atendesses, mas porque eu desliguei antes disso.
Quiseste ter–me a teu lado para me abraçares? Para partilhar agonia, desespero, fúria, dor e tudo o mais que se juntou nos dias que te separam de mim?
E os dias... longos, ásperos, cinzentos e sem emoção! Sem o teu olhar brilhante. Sem o teu sorriso cúmplice, aquele que guardavas só para mim, para partilharmos na intimidade. Na intimidade da alma. Na cumplicidade do coração.
Aquelas que se perderam.... e o tempo que se arrasta... e eu sem ti!...
Onde estávamos nós quando escolhemos caminhos diferentes? Em que ponto da nossa rota nos desviamos? Lá à frente existe alguma encruzilhada?... eu vou contigo...e tu virás sempre, sempre, sempre comigo. Onde eu for, tu estás. O que eu lembrar, tu partilhas. O que eu pensar, tu guias... e eu sei, assim, que vou estar certo, ou pelo menos, menos errado.
...e eu sem ti!... e o tempo a arrastar-se!... longo, monótono e infinitamente triste.
Nunca pensei que estava a fazer uma escolha, ainda que inconsciente, para partilhar uma nova e enorme amizade!
Nunca quis aceitar que a outra cumplicidade espelhava a separação – gradual – do meu sangue e do teu coração; que separava o teu corpo da minha alma; que separava o teu toque do meu olhar; que separava os teus sussurros dos meus espantos; que separava os teus segredos do meu riso; que te separava de mim... perdi–me, quando te comecei a sentir que estava cada vez mais próximo de ti.
Sabes o que dói mais? O que me faz sentir estupidamente impotente? O que me arrasta com o tempo, sem me importar a inércia da alma?
É o eu sentir–te; saber que estás aí perto, mas infinitamente longe de mim. Que partilhas o tempo com os outros e eu não sei o que tu sentes; não sei o móbil do teu pensamento; não sei se o alívio faz de ti um ser diferente e ainda mais distante de mim; não sei o que o teu olhar observa; o que a tua boca exprime; o que o teu corpo emana; não sei se a tua alma – também – sangra...
Eu sei o quão fútil tu achas este pedaço de mim; imagino o sorriso prazenteiro ao leres o que me vai na alma; receio o teu completo alheamento desta minha breve – e longuíssima – realidade.
Os meus músculos esboçam sorrisos; as palavras comunicam trivialidades inconsequentes; mas eu sinto (eu vejo), o meu olhar triste, cansado, demasiado desesperado e faminto de ti.
Depois deito–me e vejo–te em pedaços de papel, que contam a história de um momento que ficou imortalizado pela luz que incidia nos pequeninos halogenetos de prata. E tu estás aqui, a sorrir e eu sinto–me ainda mais triste, mais desesperadamente impotente.
A razão responde. A alma grita. O coração acelera. O corpo esmorece.
O tempo... aquele sinal vago, que conta quando o contamos, que pesa quando nos apercebemos. O elixir do qual precisamos para conhecer o amanhã. O amanhã que eu desespero para conhecer, o amanhã que eu sonho ser.
O momento

Há momentos que são mais belos que outros. Há momentos que ficarão, querendo ou não, gravados para sempre na memória. Deles recordaremos o local, a paisagem e o dia escuro. Dele também recordaremos os momentos que em silêncio aguardamos medindo o espaço de tempo que medeia entre uma onda e outra. Dele recordaremos ainda que o tempo voa e que não controlamos o momento.
Há momentos que, mesmo querendo, não nos recordaremos dos rostos que nos rodeavam, porque não eram importantes. Realmente eles nem estão lá, não existem. O momento não permite que a nossa atenção se prenda com esses pormenores.
Há momentos que mesmo falando estamos em silêncio fascinados por um rosto que lentamente vai descobrindo a criança que fomos e somos. Devagar vamos descobrindo em todos os gestos, a sensibilidade para as coisas, a inteligência, os gostos e a tendências particulares. Percorremos em silêncio, o labirinto do pensamento esperando encontrar a resposta que queremos. É neste labirinto que queremos entrar… uns conseguem-no enquanto outros não. Queremos que o silêncio se encarregue de derrubar a muralha que nos parece intransponível. Queremos porque não temos coragem nem palavras para o fazer.
Há momentos que a linguagem dos olhos é a moldura das coisas que não dizemos. O sinal que não encontramos mesmo falando sem ruído. Nestes não entendemos as meias palavras ditas em silêncio. É um dilema milenário esse comunicar.
Há momentos que o silêncio possui a limitação dos olhos e nos transporta para além do universo. Aqui falta-nos a capacidade de ler os pensamentos como o fazemos num livro aberto. Falta-nos também a força para entrar nele, como num quarto vazio e nele permanecer tornando-o na nossa morada.
Há momentos que mesmo repetidos nunca voltarão a ter o mesmo silêncio. Nunca voltará a haver a mesma cumplicidade dos silêncios. A linguagem dos olhos também não será a mesma. O cenário, mesmo que voltando ao mesmo local, não se repetirá. Tudo tem a ver com a oportunidade e o momento.
Há momentos em que sentimos o silêncio inquieto, em que imaginamos o que nos parece inultrapassável. Parecemos náufragos abandonados num oceano imenso, perdidos nos aspectos decisivos da existência. Queremos trocar as desesperanças por novas esperanças e não temos coragem para gritar os nosso desejos e sentimentos. Temos medo de matar o momento que é belo. Temos medo de quebrar o elo da amizade. Tudo coexiste no seu contrário, alegria e dor, cansaço e repouso, ausência e presença, ser ou não ser, dizer ou não dizer... basta-nos apenas continuar usando as tempestades e as bonanças que vamos encontrando pelo caminho.
Há momentos em que o silêncio se estende a nós, nos faz andar á roda, em delírio, com uma bola no estômago, um nó na garganta, os olhos arregalados. No meio destes silêncios longos mantemos o equilíbrio deixando que o tempo se encarregue de tratar de tudo.
Há momentos em que a ansiedade toma conta de nós, e desgasta o corpo e a consciência. Linguagem das paixões, o silêncio. Para apreciar este silêncio é preciso saborear silenciosamente os actos, tal como fazemos com um espectáculo, uma iguaria, uma bebida, uma pele.
É neste conjunto de silêncios e palavras que vamos cultivando a personalidade e aquilo que ela exprime. É o silêncio do prazer sereno.
A Aliança atenta dos silêncios.
É uma criatura esplêndida, carregada de charme, segura de si, altiva. Por trás da sua capa vê-se uma doce, meiga, capaz das maiores aventuras. Dou comigo a olhar para ela, contemplativo, e ela sabe-o, sente-o. Deixo de olhar para ela e ela vira os olhos para mim. Eu sei-o, sinto-o .
É uma vaga por entre o silêncio.
É uma mulher que seduz sem palavras, por isso possui uma arma temível. Por trás daquele olhar, incrivelmente palavroso, fixo aqueles olhos verdes, lindos, tão expressivos e serenos. Parecem vazios de expressão mas com o seu sorriso aberto dizem tudo o que queremos saber.
O seu corpo, o quadril, o porte da cabeça, o brilho dos cabelos, os joelhos, ai os joelhos, as pernas, a cintura, as formas bonitas, os seios, os gestos graciosos, tudo nela produz encanto que admiro, por vezes como uma certa grosseria.
Peguei-lhe na mão, nos dedos finos para poder sentir o calor do corpo. Senti carinhosamente as mazelas provocadas pelo mau funcionamento orgânico. Senti o calafrio natural de quem gosta. Ela engole-me na sua magia. A alquimia do encontro não acontece. Mas sinto-me perto, sinto-me bem, sinto-me sereno.
Para vê-la preciso saber olha-la em silêncio. Sinto que gosta de ser acarinhada, contemplada, gosta de estar rodeada de atenções e afecto.
A nossa aliança baseia-se na cumplicidade atenta dos silêncios. Em silencio saberá descobrir e saberá enroscar-te no meu amor como se uma roupa aconchegante vestisse. O enroscar de uma serpente que de forma lenta e dócil apertará o meu corpo, esmagando-o e dele extraindo todo o calor.
O dia chegará em que na cumplicidade atenta dos silêncios, a verdadeira beleza do amor se fará graça e esforço, dádiva e conquista permanente.
O silêncio que se seguirá dirá tudo sobre a qualidade do prazer, ou das frustrações, sobre a verdadeira satisfação dos amantes, da sua eventual regeneração e da sua harmonia, nua.
É sempre um prazer estar com ela mesmo no silêncio.
Será sempre uma atenta aliança de silêncios.
A nascer o sol.
Deito-me. Não há um consentimento nítido em que a lua desça até ao meu rosto.
No canto onde me abrigo a tarimba é um emaranhado de panos fiados e mantas grosseiras. Uma tentativa vã de ajeitar o fato porque o sono entorna sobre mim os vapores do feitiço.
Ontem quase mergulhei na terra, na sede de me revigorar. Estava a nascer o sol. Não era dia nem noite. Pensei desistir do amor e aquietar-me, dormente, mas uma iluminura estreita foi tomando corpo em mim e apoderou-se. Ali. Um aroma que não identificava atraía os meus sentidos. Lembrei-me que algumas horas antes tinha principiado a contar as estrelas.
Reparei nos olhos redondos, verdes, e tão fixos de um gato que me fitavam, como se fossem uma observação profunda do meu ser. Devolvi-lhe o olhar e envolvemo-nos num fio de energia que me confortou.
A vida espalha-se por todas as fendas, a vida resplandece nos escombros que as ervas vão invadindo.
Nas ruínas escondem-se pedaços da nossa vida. A natureza não está muda. Mas esperemos que, no silêncio das nossas consciências, a mensagem passe.
Experimentei respirar lentamente e a fraqueza que me tomara antes diluiu-se no vapor do instante. Reencontrei-me no emaranhado do fato da minha alcova. Esse meu lugar de ausência fica num sótão dois degraus normais acima da terra.
O pensamento de estar um pouco ao alto aliviou-me este cansaço esta mágoa. Esperaria mais algumas horas para recomeçar a contar as estrelas. Entretanto aquele olhar fixo do gato estaria lá para me observar. Então aí, talvez a lua insistisse em descer ao meu rosto. E eu cedesse.

Thursday, November 17, 2005

O momento
Falta no máximo meia hora para que a noite acabe; ainda tenho algum tempo. O Sol não deve tardar aí. Começa-se agora a notar aquela estranha claridade que anuncia o nascer do dia. Olho á volta. Ali o mar e as dunas. Do outro lado a ria. Tudo é belo nesta estranha claridade. Suspiro e fecho levemente os olhos, tento rever aquela imagem no meu cérebro. Tão belo! Volto-me para dentro e sento-me de pernas cruzadas no centro de mim próprio. Fico uns momentos assim, de olhos fechados, meditando. Sinto o calor do teu olhar, o cheiro do teu corpo... estou aqui contigo.
O frio e a humidade são medonhos, atravessam-me os ossos. Abro de novo os olhos. O silêncio é total, mas eu sinto que o sol está de volta. Tenho pouco tempo, agora. Erguendo a voz bem alto, eu falo, certo de que alguém me olha e me ouve. " Perdoa-me, minha querida! É teu o meu coração (bem o sabes), mas a minha alma está geminada à do Sol — não há nada a fazer..."
Volto a olhar para dentro de mim. Em alguns instantes apenas, o espectro azul estará aqui. Na solidão adimensional do Limbo, revejo os momentos, a história de umas horas. Nunca serei capaz de ultrapassar o momento.
Quando o meu espírito recupera do vazio anil em que se encontrava, o Sol já nasceu. À minha frente, já não está a linda mulher de azul. Estou apenas eu e o mar, o sol e a ria.
Estou feliz, mas não consigo mais do que sorrir levemente: os músculos da minha face não respondem; também não sinto o corpo...
... mas estou feliz.

Wednesday, November 16, 2005

Silêncios do Sonho
Cada dia que passa tem os seus. Ontem disse-lhe uma frase que a aborreceu. Não me respondeu.
No silêncio que se instalou entre nós, ambos lado a lado na cama, senti uma onda vermelha chegar até mim, vibração de cólera que esmaga o espaço que nos separa.
É invisível, inaudível, inodora, mas está lá. Incrivelmente presente.
Em resposta eu acaricio-a, digo-lhe palavras doces, finjo que disse aquilo por dizer, tento transformar em piada, que estúpido que sou.
Ela nada diz, sinto-a sorrir no escuro, a onda agressiva acalma-se, transforma-se em ternura.
Sempre silenciosa.